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Carrapatos sob controle

CARRAPATOS SOB CONTROLE 


Com um plano estratégico de controle, é possível reduzir as infestações nas pastagens e nos animais e, dessa forma, mitigar os impactos econômicos causados pelos carrapatos. 


Velhos conhecidos dos pecuaristas, os carrapatos, apesar de pequenos no tamanho, são capazes de causar grandes danos ao bolso do produtor e à economia. Um levantamento da Embrapa Gado de Corte, de 2019, apontou que o prejuízo gerado para a pecuária brasileira é superior a 3 bilhões de dólares por ano. Em nível global, estima-se que 80% do rebanho bovino mundial (de corte e leiteiro) são afetados por carrapatos, com prejuízos da ordem de 30 bilhões de dólares.


O principal responsável pela infestação dos rebanhos bovinos no Brasil é o Rhipicephalus (Boophilus) microplus ou, simplesmente, carrapato-do-boi, espécie presente em todo o território nacional. 


Por se alimentar de sangue, esse carrapato passa necessariamente uma fase de sua vida em um hospedeiro. É nesse momento que ele pode provocar no gado perda de peso e de produtividade, ser vetor de doenças (como a Tristeza Parasitária Bovina) e, ainda, levar o animal à morte. No entanto, é no ambiente que encontra-se a maioria das fases de vida do carrapato (ovos, larvas, ninfas e adultos), as quais são muito suscetíveis às variações das condições climáticas (fase de vida livre).


A chegada do período das chuvas, acompanhada do aumento das temperaturas, é a combinação perfeita para a proliferação desses parasitas no ambiente. Por essa razão, o fim do inverno é o momento propício para a elaboração ou revisão do plano de controle dos carrapatos na propriedade.  


Fazendas que sofrem com alta ou média infestação por carrapatos nos campos podem lançar mão do controle estratégico como ferramenta de combate a esses parasitas. O objetivo dessa abordagem é controlar a população de carrapatos nas épocas mais desfavoráveis ao seu desenvolvimento, quebrando o ciclo de vida do parasita, de modo a evitar que as fêmeas ingurgitadas caiam na pastagem em busca de um local para depositar seus ovos. Isso causa uma redução no número de carrapatos no pasto e, consequentemente, nos animais.


Portanto, para colocar em prática um controle mais efetivo do carrapato, é importante conhecer o seu ciclo de vida e suas interações com as mudanças nas condições do ambiente; a sua sazonalidade, para identificar quando a população está mais vulnerável ao controle; bem como identificar os animais mais suscetíveis, conhecidos como de “sangue doce”. 


Segundo a médica veterinária e pesquisadora do Instituto de Zootecnia do Governo do Estado de São Paulo, Dra. Cecília Veríssimo, o controle estratégico do carrapato é preconizado há alguns anos pela Embrapa e pelo Centro Nacional de Gado de Leite. “Em linhas gerais, recomenda-se o tratamento continuado, de 5 a 6 banhos com acaricidas, com intervalo de 21 dias, iniciando o tratamento ao final do período desfavorável ao desenvolvimento do carrapato na pastagem” explica, o que ocorre, geralmente, ao fim do inverno ou início da primavera, podendo variar de acordo com as características regionais.


Conhecendo o inimigo


“O grande problema que enfrentamos hoje no controle dos carrapatos é a resistência aos produtos. Para que o controle estratégico atinja seu objetivo de reduzir drasticamente a população de carrapatos, é necessário que o produto usado esteja efetivamente funcionando, com mais de 80% de eficácia”, afirma Dra. Cecília. 


É por isso que o primeiro passo do controle estratégico é descobrir quais produtos são eficazes contra os carrapatos presentes na propriedade. Para isso, a pesquisadora explica que o produtor deve, ao identificar uma infestação, coletar as fêmeas do carrapato mais graúdas e colocar, em um pote limpo, uma quantidade equivalente a dois dedos. 


O produtor deve então fazer o envio dessa amostra para a Embrapa Gado de Leite que identificará, por meio de testes de bioensaio ou carrapaticidogramas, os produtos mais eficientes para controlar a população de carrapatos da fazenda. A análise é gratuita e o produtor arca apenas com o custo de envio da amostra. 


“O produto que funciona em uma determinada propriedade pode não dar resultados na propriedade vizinha, porque depende do histórico de uso dos carrapaticidas de cada fazenda e a resistência que foi criada”, alerta a doutora. 


Controle seletivo 


A pesquisadora adverte que não é incomum encontrar fazendas em que nenhum dos carrapaticidas disponíveis seja mais efetivo no controle dos carrapatos. Nestes casos, o que o produtor pode fazer? 


Nos últimos cinco anos, ela tem se dedicado a estudar uma forma de tratamento que aposta no controle seletivo, e tem mostrado bons resultados, sobretudo com gado mestiço e da raça Jersey. 


O controle seletivo consiste na aplicação do carrapaticida apenas nos animais que realmente precisam, ou seja, aqueles com maior infestação ou que se mostram mais suscetíveis. “Com esses estudos, estamos tentando desenvolver parâmetros a partir dos quais o produtor possa tomar a decisão se é o caso de aplicar o carrapaticida no animal ou não”, esclarece a pesquisadora. 


Neste caso, a aplicação precisa ser feita a cada três semanas. “Essa é a parte mais complexa dessa abordagem. Pois é necessário observar todos os animais do rebanho para identificar aqueles mais infestados e que deverão ser tratados”. 


Para identificá-los, a pesquisadora dá as seguintes dicas: “Eu conto apenas os carrapatos acima de 4 milímetros, considerando o terço anterior do animal, ou seja, cabeça, pescoço, axilas e membros anteriores. Isso porque identificamos, em estudos anteriores, que existe uma correlação muito grande entre a contagem nesta parte frontal do animal com a contagem total”. 


Os animais que seguirão para o tratamento serão aqueles que tiverem mais de oito carrapatos, no caso de animais adultos, e de quatro carrapatos, no caso de bezerros. “Abaixo disso, trata-se de uma infestação com a qual o animal consegue lidar sozinho e que não causará malefícios a ele”, explica. 


Os resultados da adoção do controle seletivo são muito promissores. Em um estudo conduzido sob sua orientação, em Nova Odessa (SP), com um rebanho leiteiro de cerca de 100 animais de diferentes grupos genéticos, em sistema semi-intensivo, apresentou redução média no uso de carrapaticidas de 94,9% para Girolando, de 81,5% para Jersey, de 79,1% para os animais mestiços, e de 34,3% para Holandês, apesar destes últimos terem apresentado as maiores médias na contagem de carrapatos, o que demonstra que mesmo em rebanhos altamente suscetíveis é possível usar o controle seletivo.


Dentre os benefícios alcançados, segundo o estudo, estão a economia gerada para o produtor pela diminuição no uso de carrapaticidas e o retardamento do efeito da resistência. Além disso, o menor uso de carrapaticida implica em diminuição na quantidade de resíduos químicos no leite e derivados, o que é muito positivo para os consumidores. 


Raças mais suscetíveis


O controle seletivo tem como princípio o fato de que existem animais resistentes aos carrapatos, que conseguem sozinhos se livrar da infestação. “Eles fazem isso através da autolimpeza. Quando um animal está se lambendo, ele está retirando as larvas que estão subindo nele. Dessa forma, impede que elas completem seu ciclo de vida”.


Acontece que o gado holandês é a raça mais suscetível aos carrapatos. Em um rebanho holandês, apenas 10% a 20% dos animais não vão necessitar de aplicação do carrapaticida, segundo a pesquisadora. 


Isso porque o animal puro holandês ou que tem sangue holandês não percebe os parasitas enquanto estão em sua fase de larva ou ninfa, e só vai se sentir incomodado com a fêmea ingurgitada. “É na transição de fêmea partenógina para teleógina, quando ingere muito sangue do hospedeiro e aumenta seu tamanho em 200 vezes, que a fêmea causa prejuízos, pois retorna, para a circulação do animal, o sangue junto com produtos do seu metabolismo, intoxicando-o, e podendo causar, inclusive, anemia ou Tristeza Parasitária”. 


Por essa razão, a pesquisadora recomenda que, em casos de propriedades com problemas graves de infestação, o produtor deve considerar o descarte dos animais que possuem alta sensibilidade ao carrapato, bem como o investimento em raças mais resistentes. 


“Uma saída para o gado holandês é dar preferência para as linhagens europeias que, por ficarem mais a pasto, são mais resistentes ao carrapato do que as linhagens americana e canadense, por exemplo”


Outra dica da pesquisadora é priorizar animais com predominância do pelame preto, que é mais curto do que o branco. “Percebemos uma relação entre o comprimento do pelo e a infestação por carrapato. Animais de pelo curto tendem a ter menos carrapatos que animais de pelo longo. Além disso, por absorver mais calor, o pelo preto acaba sendo um ambiente mais hostil para o desenvolvimento da larva do carrapato”, aponta Dra. Cecília. 


Outra vantagem de preferir animais holandeses com mais pelame preto é que por debaixo dele, o animal tem uma pele também preta, que funciona como um filtro solar natural, protegendo-o do sol.     


 Terapias alternativas 

Para driblar a resistência aos carrapaticidas, novas opções de produtos para o controle dos carrapatos vêm sendo desenvolvidas. O controle biológico é uma das soluções que despontam, neste contexto, com a vantagem de atacar o parasita tanto na sua fase de vida livre, como parasitária, sem incorrer no efeito da resistência e sem gerar resíduos no leite e na carne produzidos. “Na literatura, existem muitos estudos mostrando os impactos positivos do controle biológico. No entanto, por se tratar de um produto biológico, são necessários alguns cuidados no seu manejo e aplicação”, alerta. 

 Outra alternativa é o controle dos carrapatos por meio de óleos essenciais, como o de eucalipto, por exemplo, que apresentou uma boa eficácia no combate às larvas. “Muitas pesquisas foram desenvolvidas com esse foco e acredito que logo teremos um produto no mercado à disposição do pecuarista”. 

Outra ferramenta que pode auxiliar o produtor no controle dos carrapatos é a homeopatia, que segundo a pesquisadora, traz bons resultados. “Quanto mais cruzado o animal, melhor é o efeito da homeopatia no combate ao carrapato, pois a sua atuação é dependente do sistema imunológico do animal”. 

 

Cecília Veríssimo é Médica Veterinária pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), Mestre em Zootecnia pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp) e Doutora em Zootecnia - Qualidade e Produtividade Animal pela Universidade de São Paulo (USP). Atua como pesquisadora do Laboratório de Referência em Biotecnologia da Produção Animal, no Instituto de Zootecnia do Governo do Estado de São Paulo, em Nova Odessa (SP). 

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